sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Ainda a propósito do Grândola, Vila Morena

Muito se tem falado sobre as interpelações de que vários ministros foram alvo nos últimos dias ao som da canção Grândola, Vila Morena. Confesso que não simpatizo particularmente com a música, não por razões estéticas, mas por motivos políticos, pois embora tenha sido a senha que deu marcha ao golpe militar de 25 de Abril, transformou-se, com o tempo, no símbolo de um projecto de revolução que, a ter tido sucesso, teria desviado o país do rumo para a democracia que o MFA prometera ao país.
Porém, em certos sectores tem-se ouvido um clamor, a meu ver exagerado e tremendista, sobre estes episódios. Fala-se de atentados à liberdade de expressão, à democracia, como se a revolução pelas armas estivesse ali ao virar da esquina. Mais uma vez a direita portuguesa mostra o seu medo atávico da rua. Falam destas manifestações, essencialmente pacíficas, como se fossem cortes de cabeça.
Embora não aprecie este tipo de protestos, não só os compreendo como não os considero, de todo, actos ilegítimos. Com efeito, a população portuguesa está justificadamente descontente com a situação económica e financeira que o país atravessa, mas também insatisfeita com a degradação do sistema político e partidário, que – essa sim – pode, a prazo, fazer perigar a democracia. Estes actos de protesto, num país pouco dado a eles são, em suma, a expressão não apenas do empobrecimento da população, mas sobretudo da descrença e do desapontamento com um regime que está doente e a prova disso é o facto de o principal alvo destas manifestações ser Miguel Relvas, um símbolo bem evidente da degradação da vida pública.
Por isso, causa-me alguma irritação esta gente que berra “Aqui d’el Rei!”, sempre que um grupo de cidadãos se põe a cantar. E, sintomaticamente, teve que ser um estrangeiro, Viviane Reding, uma mulher de direita, a dar aos seus pares uma lição de democracia, colocando a questão nos devidos termos, ao dizer – e muito bem -  que feliz é um povo que se expressa cantando ao invés de partir montras e arremessar cocktails molotov. Bom seria que a direita nativa percebesse isto, de uma vez por todas.

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