sábado, 19 de maio de 2012

A bem da Nação


Desgraçadamente, o Governo de Passos Coelho está a ficar demasiado parecido com o de José Sócrates. As pressões exercidas por Miguel Relvas sobre uma jornalista do Público, recorrendo a ameaças e chantagens, tornam inaceitável a sua permanência no Executivo. Embora seja difícil para o Primeiro Ministro - bem o sabemos - demitir um homem do aparelho partidário, a preservação da sua autoridade moral - tão necessária em tempos de sacrifícios - assim o exige. A bem da Nação, como se dizia outrora.

segunda-feira, 14 de maio de 2012

Imoral e perigoso

Gestores do PSI-20 ganham 44 vezes mais que os trabalhadores

Há alguns anos, o historiador Niall Ferguson - insuspeito de ser de esquerda - afirmava, perante uma notícia em tudo semelhante a esta, mas respeitante aos EUA, que não seria surpreendente que, em face de tamanha disparidade de rendimentos, os cidadãos se pudessem sentir tentados a apoiar um qualquer demagogo do calibre de Hugo Chavez.
De facto, para além deste fosso ser moralmente afrontoso, torna a sociedade demasiado desequilibrada, logo menos coesa, potenciando o confronto entre uma pequena cúpula, fechada no seu casulo dourado, e as  bases, cada vez mais empobrecidas. Se estas elites, ao invés de se entreterem a gastar milhões com uma voragem nova-rica, se dedicassem mais a ler livros de História, decerto perceberiam que estão a construir o seu próprio cadafalso, empurrando as multidões para os braços do primeiro populista que lhes venha falar dos amanhãs que cantam e que reclame a cabeça dos ricos como condição para a felicidade geral.
Como dizia Disraeli, primeiro-ministro conservador da rainha Vitória, do qual, estou certo, a maioria destes senhores nunca ouviu falar,  "The palace is not safe when the cottage is not happy".

quarta-feira, 9 de maio de 2012

Praise the Lords


A reforma constitucional hoje anunciada pelo Governo britânico no Queen’s Speech, que contempla a eliminação dos poucos lugares ainda reservados aos pares hereditários na Câmara dos Lordes, é uma medida perigosa e injusta.
Perigosa porque ao pôr em causa o princípio hereditário como condição de acesso a um cargo público põe, em última instância, em xeque a própria Monarquia.
Injusta porque suprime a representação da aristocracia do derradeiro orgão de soberania onde ainda tinha assento, grupo social que esteve no epicentro da vida política no Reino Unido pelo menos até à II Guerra Mundial, altura em que a nobreza do resto da Europa já não desempenhava um papel relevante na vida pública, tendo sido inestimável o seu contributo para que este país fosse o que hoje é – uma grande nação e a mais antiga e sólida democracia do Mundo. De facto, relutantemente ou não, a aristocracia britânica aceitou – contrariamente a muitos dos seus pares em alguns países do continente – a democratização do sistema político, à custa do seu próprio poder. Há que não esquecer que os governos que promulgaram, com a necessária aprovação da Câmara dos Lordes, as sucessivas Reform Bills que alargaram o sufrágio popular, contavam, no seu elenco, com vários titulares. Por outro lado, os aristocratas nunca se furtaram a servir o seu país não apenas no Executivo, mas também nas Forças Armadas, na Diplomacia e na Magistratura, além de terem assumido – mais uma vez ao contrário dos nobres continentais – um papel relevante no progresso económico do país, investindo, empreendendo. Exemplo dessa ética de serviço público foi a participação do pariato na Grande Guerra: percentualmente, foi o grupo social mais afectado pelo conflito, pois um em cada cinco aristocratas que partiu para o campo de batalha – e foram muitos – não regressou a casa.
Não parece, pois, justo que este extracto da sociedade britânica seja liminarmente arredado dos assuntos públicos e não apenas por razões históricas, embora estas sejam importantes, pois um povo não deve esquecer o seu passado: afinal de contas nós somos o que fomos. Com efeito, a nobreza britânica tem, a meu ver, um papel a desempenhar no Reino Unido do Século XXI: além da experiência secular de serviço público, que constitui um inestimável asset, muitos aristocratas, afastados das mundanidades de uma alta sociedade que entretanto desapareceu, retiraram-se para as suas propriedades no campo, assumindo-se actualmente como porta-vozes do mundo rural, praticamente esquecido pelos políticos de Westminster. Por outro lado, na qualidade de proprietários de residências históricas e de um património histórico de vulto, numerosos pares chamaram a si a causa da defesa do património, valor tantas vezes esquecido nestes tempos utilitários e obsessivamente centrados no dinheiro.
A presença da nobreza na Câmara dos Lordes, parece, assim, plenamente justificada. O seu afastamento só se compreende, portanto, ou à luz do ódio de classe, que um governo de maioria conservadora devia de todo evitar, porque contrário aos seus valores e ao próprio interesse nacional, ou a uma mauvaise conscience do senhor Cameron, que possivelmente não se sente confortável com a sua própria condição de aristocrata.

domingo, 6 de maio de 2012

A esquerda e o povo

Eduardo Cintra Torres escreve no Correio da Manhã sobre a campanha do Pingo Doce. Nada direi sobre o assunto que foi tema de polémica ad nauseam na blogosfera - o que não deixa de ser revelador da indigência intelectual do debate público nativo. Refiro-me portanto ao artigo, não pelo seu conteúdo, de que, aliás, discordo, mas por uma passagem que me parece particularmente feliz. Diz Cintra Torres, a respeito da forma pedante como a gauche caviar descreveu as multidões que se aglomeraram à porta dos supermercados, que esta "adora abstractamente e odeia concretamente" o povo. Nem mais! Desde a Revolução Francesa, cujos chefes iluminados desprezavam a Vendée,  às ditaduras socialistas do Séc. XX, que procuraram impor ao povo, de forma intelectual e fisicamente violenta, conceitos de homem e de sociedade estranhos suas às culturas, tradições e credos, jamais a esquerda, que sempre disse agir em nome deste, o compreendeu e muito menos respeitou. O povo, no amor que a esquerda nutre pela abstracção, assume um mero valor instrumental, conceptual, nas suas arquitecturas ideológicas. No concreto, é apenas uma mole mais ou menos humana, bronca, alienada e ignorante da qual não querem mais do que distância.

quinta-feira, 3 de maio de 2012

Desabafos

Que saudades do Antigo Regime, quando nem o povo nem os comerciantes faziam política...