domingo, 6 de maio de 2012

A esquerda e o povo

Eduardo Cintra Torres escreve no Correio da Manhã sobre a campanha do Pingo Doce. Nada direi sobre o assunto que foi tema de polémica ad nauseam na blogosfera - o que não deixa de ser revelador da indigência intelectual do debate público nativo. Refiro-me portanto ao artigo, não pelo seu conteúdo, de que, aliás, discordo, mas por uma passagem que me parece particularmente feliz. Diz Cintra Torres, a respeito da forma pedante como a gauche caviar descreveu as multidões que se aglomeraram à porta dos supermercados, que esta "adora abstractamente e odeia concretamente" o povo. Nem mais! Desde a Revolução Francesa, cujos chefes iluminados desprezavam a Vendée,  às ditaduras socialistas do Séc. XX, que procuraram impor ao povo, de forma intelectual e fisicamente violenta, conceitos de homem e de sociedade estranhos suas às culturas, tradições e credos, jamais a esquerda, que sempre disse agir em nome deste, o compreendeu e muito menos respeitou. O povo, no amor que a esquerda nutre pela abstracção, assume um mero valor instrumental, conceptual, nas suas arquitecturas ideológicas. No concreto, é apenas uma mole mais ou menos humana, bronca, alienada e ignorante da qual não querem mais do que distância.

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